quarta-feira, 6 de junho de 2012

MULHER EM SITUAÇÃO DE VIOLÊNCIA

Em 2004, Wania Lilia Maia Viana publicou este texto no Jornal Página 20, vale a pena sempre repetir, temos que continuar lutando e conscientizando mais gente.


Pagina 20

Wânia Lília Maia Viana


Mulher em situação de violência - O que os homens e mulheres têm a ver com isso?

O dia 8 de março representa bem mais do que a lembrança triste da forma em que 130 trabalhadoras foram assassinadas, queimadas, no interior de uma fábrica em Nova Iorque, quando reivindicavam seus direitos.

Representa à necessidade constante de luta, a esperança, a crença numa sociedade melhor, onde possa haver “igualdade, mas com respeito às diferenças”.

É comum o questionamento, até em tom de brincadeira, por parte dos homens - “mas por que comemorar o dia da mulher? Por que existir Delegacia da Mulher? Por que não criam a delegacia para atender o homem?

Infelizmente, apesar das conquistas já obtidas (direito ao voto, licença maternidade, legislações que progridem, quando retiram preceitos absurdos que colocavam a mulher em posição de submissão ao homem, entre outras), ainda existe a necessidade de se lembrar o dia 8 de março, de se ter a Delegacia Especializada da Mulher. 

Nosso país tem mais da metade da população constituída de mulheres. 
Por mais que se lute, pesquisa realizada por organizações não governamentais, em 2002, revelou que a cada 15 segundos uma mulher sofre algum tipo de agressão no Brasil. E o que é pior, 70% dos casos acontece dentro do próprio lar, tendo o marido/companheiro como o agressor.

Em 2003 tivemos 7.408 Notícias Crimes (“queixas”) registradas na DEAM de Rio Branco (que tem também por abrangência os municípios de Porto Acre e Bujari). 

Esses casos chegaram à delegacia. E os outros? Aqueles que não aparecem nas estatísticas estão envoltos no silêncio das vítimas, na omissão de algumas pessoas que prefere não se envolver, pois ainda acreditam que “em briga de marido e mulher ninguém mete a colher”.

O silêncio da mulher em situação de violência, pela análise dos casos que atendemos e pela literatura observada, é motivado por diversos fatores, dentre eles o medo, a dependência econômica ao companheiro, o amor em excesso e ameaças recebidas.

Para a sociedade expectadora, que não vive tal situação de violência (graças a Deus) é mais fácil dizer “mulher gosta de apanhar, registra a queixa num dia e retira no outro”.

Enquanto não entendermos os motivos dessa mulher que se cala, que está em situação de violência, buscar alcançar a confiança dela, o coração dela, estaremos fadados a continuar alardeando inverdades sobre essa mulher que sofre, independente de classe social, pois a dor e a humilhação destroem a auto-estima e a deixam vulnerável, sem ação, abatida, acuada. 

Há a necessidade de ajudar essa mulher; ajudar o agressor.

Na maioria dos casos a mulher não deseja a separação, ela quer dar um basta à violência.

A violência doméstica não pode ser tratada da mesma forma que uma briga de vizinho. 
Necessária se faz uma política constante, continuada, não só do setor público, mas da sociedade, de conscientização dos direitos da mulher. Punições devem ocorrer a esses agressores, mas a lei que pune deve ter também o caráter educativo, de transformação de culturas ultrapassadas que permeiam a vida, o dia a dia do homem, visando uma sociedade mais humana, haja vista que sabemos que o casal geralmente vai continuar junto. E se houver separação, ainda há o risco de que o homem reproduza a violência na nova família que venha a constituir. 
A problemática, com conseqüente resposta aos questionamentos dos homens sobre as “regalias” às mulheres, a que me referi anteriormente, só vai ser definida, resolvida, quando houver respeito mútuo entre os sexos, direitos e oportunidades iguais e justas. Quando se entender que frases do tipo “isso é coisa de homem”, “isso e coisa de mulher” são conceitos arraigados na sociedade, que levam à discriminação, e também, provavelmente, causam um conflito interior no homem (no sentido mais amplo da palavra), pois fica, às vezes, reprimindo sentimentos, ações, temendo reações da sociedade, que já estipulou, ao longo do tempo, o que é próprio do homem, e o que é próprio da mulher.

E assim chegará o dia onde não haverá mais necessidade de Delegacias Especializadas da Mulher; haverá apenas a delegacia do cidadão.

Para tanto, não podemos esquecer que os homens que não agridem mulheres devem ser parceiros nessa luta, nessa pregação pelo fim de qualquer tipo de violência à mulher. Não há mais espaço para “Clube da Luluzinha”, “Clube do Bolinha”. O Movimento de Mulheres já entendeu isso há algum tempo. Os homens que promovem a Campanha do Laço Branco (homens pelo fim da violência contra a mulher, iniciada no Brasil em 1999) também têm o mesmo pensamento.

A luta requer parceria, união de todos, compreensão do coração humano. Há que se chegar a esse coração do homem que tem atitudes agressivas, para tratá-lo, trazê-lo para a luta e transformá-lo em fonte de paz.

Há que se ter uma postura firme frente a esse fenômeno da violência de gênero. Não existe espaço para quem fica em cima do muro e expõe suas idéias conforme a ocasião, conforme os ouvintes, a fim de se manter “bem” com todo mundo, mas ajudando a formar uma cultura que discrimina, e quando toco neste assunto incluo também as próprias mulheres, pois, muitas vezes, propagam essa discriminação. 


Parte do texto publicado no 

http://pagina20.uol.com.br/07032004/opiniao_2.htm